quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Usina de Belo Monte, quem tem razão?

A Advocacia Geral da União divulgou nota defendendo a licença ambiental emitida pelo Ibama para a construção da Usina de Belo Monte, e rechaçando as medidas que o Ministério Público Federal no Pará pretende adotar para impedir a licença.
O Ministério Público Federal respondeu, também em nota pública, rebatendo as críticas da AGU.
Veja abaixo as notas. Quem tem razão?

A Advocacia-Geral da União (AGU) divulgou nesta quarta-feira (03/02) Nota Pública na qual rechaça ameaças feitas por membros do Ministério Público Federal em relação a liberação da licença para a construção da Usina Hidroelétrica de Belo Monte.

A licença prévia que autoriza a realização de leilão para construção da usina foi emitida na segunda-feira (01/01). Porém, antes mesmo que seus fundamentos fossem conhecidos e analisados, membros do MPF no estado do Pará anunciaram que vão pedir a anulação da licença e pretendem processar os técnicos do Instituto Nacional do Meio Ambiente (Ibama) que assinaram o documento.

De acordo com a Advocacia-Geral da União, ações infundadas movidas contra os agentes públicos serão rebatidas, inclusive por meio de representação no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), que é o órgão de controle dos membros do Ministério Público.

Veja, abaixo, a íntegra da Nota Pública.

NOTA PÚBLICA

O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) concedeu, nesta segunda-feira (01/02), a licença prévia que permitirá o leilão de concessão para a construção e exploração da Usina Hidroelétrica de Belo Monte, no Pará. Este empreendimento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) tem previsão de gerar energia elétrica para 21 milhões de lares.

Porém, antes mesmo de conhecer os fundamentos técnicos e jurídicos da licença, alguns membros do Ministério Público ameaçaram acionar a Justiça para impedir a construção da usina e punir, por suposta prática de improbidade administrativa, os servidores e autoridades do Ibama que concederam a licença.

No exercício de suas atribuições, não é dado a membros do Ministério Público impor seu entendimento pessoal aos demais agentes do Estado, mas apenas a vontade da lei. E esta vontade somente pode ser verificada, em processos complexos como a construção de uma usina hidroelétrica, por meio de um estudo desapaixonado e aprofundado do projeto e de todos os seus atos. Um exame impossível de se realizar em questão de horas, que foi o tempo decorrido desde a divulgação da licença de Belo Monte.

Um agente do Estado investido de uma competência legal fundamental, como é o caso dos promotores de Justiça e dos procuradores da República, não pode ter uma postura preconceituosa, precipitada e desprovida de análise técnica e jurídica consistente.

Tais desvios de conduta, por certo isolados, já ocorreram no passado quando procuradores tentarem fazer prevalecer suas convicções por meio de ameaças travestidas de processos judiciais, numa clara tentativa de intimidar servidores da Administração Pública, configurando verdadeiro abuso no âmbito do processo judicial.
Isso ocorreu no caso do complexo hidroelétrico do Rio Madeira, em que o Presidente do Ibama foi vítima de ações de improbidade administrativa por ter validado a concessão da licença ambiental da Usina de Jirau. Essas ações, por serem tão carentes de qualquer plausibilidade e fundamento, não foram sequer admitidas pela Justiça Federal.

Diante disso, a Advocacia-Geral da União, na defesa da legalidade dos atos e da probidade dos gestores públicos federais, confiando que o próprio Ministério Público tem instrumentos internos de controle eficientes de atos abusivos praticados por seus membros, representará ao Conselho Nacional do Ministério Público contra os responsáveis pelo ajuizamento das ações infundadas referentes à Usina de Jirau e, em caso de reincidência, à Usina de Belo Monte.

Nos casos mais graves, a AGU não relutará em ajuizar ações de improbidade administrativa em nome da União contra os membros do Ministério Público que, violando seus deveres legais, eventualmente abusarem de suas prerrogativas por meio de ações sem fundamento, destinadas exclusivamente a tumultuar a consecução de políticas públicas relevantes para o país.

ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO


MPF responde nota da Advocacia-Geral da União sobre caso Belo Monte

Procuradores da República no Pará defendem trabalho que MPF realizou em relação ao projeto hidrelétrico

O Ministério Público Federal (MPF) no Pará divulgou nesta quarta-feira, 3 de fevereiro, texto em resposta à nota pública em que a Advocacia-Geral da União (AGU) afirma que poderá recorrer ao Conselho Nacional do Ministério Público e ajuizar ações de improbidade contra os responsáveis pelo ajuizamento das ações referentes à Usina de Belo Monte. Veja a íntegra da resposta do MPF:

"A pretexto de posicionar-se quanto ao licenciamento prévio concedido para a Usina Hidrelétrica de Belo Monte, a Advocacia-Geral da União divulgou nota pública em que aponta desvio de conduta na atuação do Ministério Público Federal no Estado do Pará.

Tais críticas, em tom ácido, parecem desprezar que um Estado democrático não se constrói com base na coerção, direta ou velada, provenha ela de onde vier.

O embate de ideias e o debate quanto à extensão da proteção constitucional ao meio ambiente e ao patrimônio público, bem como a obrigação do Estado brasileiro de proteger minorias étnicas e sociais são temas que não se amoldam a discursos fáceis ou a arroubos de estilo.

Desde 1997, o MPF vem acompanhando e abertamente discutindo as várias questões sociais, ambientais e patrimoniais que se inserem no complexo projeto da Hidrelétrica de Belo Monte e sobre elas nunca se furtou ao cumprimento de suas funções.

Ao contrário do que faz parecer a nota divulgada pela Advocacia-Geral da União, nenhum juízo de valor definitivo foi externado pelos membros do MPF, quer quanto ao comportamento de servidores públicos federais, quer quanto ao teor da recém-divulgada licença de instalação concedida pelo Ibama. E mais, a posição até aqui externada não se baseia em “postura preconceituosa, precipitada e desprovida de análise técnica e jurídica consistente”, e, sim, no desenrolar de uma análise impessoal, objetiva e cuidadosa, resultado do acompanhamento por quase treze anos de inúmeras discussões que vem sendo travadas e da qual participaram diversos membros do MPF e suas instâncias internas de coordenação e revisão. Não há, então, nem mesmo resquício da quebra da impessoalidade e da isenção que se exige dos agentes públicos.

Tal constatação, todavia, não afasta alguns fatos concretos:

1 - em diversas oportunidades, quer em juízo, quer administrativamente, o MPF deixou claro que vários vícios procedimentais estavam sendo praticados (tais como a realização meramente formal de audiências públicas, que, na forma como conduzidas, obrigariam um ribeirinho atingido pela obra a se deslocar de 200 a 255 quilômetros para falar por, no máximo, três minutos) e que tais erros implicariam na nulidade da licença que viesse a ser concedida;

2 - ainda durante a fase de análise do licenciamento, o MPF sustentou (e continua a fazê-lo) que estudos que seriam necessários para a análise prévia não poderiam ser postergados e, portanto, se era obrigação, por exemplo, estudar os impactos da obra sobre a população ribeirinha como um dos elementos do diagnóstico do Estudo Prévio de Impacto Ambiental, não poderia a licença prévia transformar tal obrigação em condicionante, jogando para o futuro aquilo que era obrigação do passado.
Estes dois exemplos demonstram, claramente, que não há açodamento e que as conclusões iniciais não se construíram em horas, mas, sim, em anos de acompanhamento de um processo que envolve bem mais do que o marketing oficial ou a vontade soberana de quem quer que seja.

É necessário, dentre outros temas, que o Estado brasileiro assuma quais os dados reais desta obra, tais como seu custo (se R$ 9,6 bilhões, como declarado no licenciamento, ou algo entre R$ 22 bilhões e R$ 30 bilhões como se anuncia agora), sua capacidade de produção de energia (já que a propaganda oficial insiste em divulgar 11 mil megawatts, deixando de anunciar que tal produção ocorrerá em apenas poucos meses de alguns anos e que estima-se uma produção efetiva de energia não superior a 4 mil megawatts), que condicionam a viabilidade econômico-financeira da obra e os impactos de tais decisões sobre o modelo de desenvolvimento sustentável que se pretende implantar.

É necessário que a sociedade brasileira efetivamente veja suas instituições públicas funcionando, com o MPF exercendo sua função de fiscal da atividade estatal, com o Ibama velando por um licenciamento adequado e com a AGU atuando na defesa do Estado brasileiro, todos de forma responsável, sem incidir no risco da prematura condenação quanto às críticas aos atos administrativos.

A crítica e o debate franco não deveriam, ainda hoje, causar tanto desconforto em quem ocupa funções públicas e deve estar aberto a ouvir a sociedade e a cumprir a obrigação da transparência e do respeito à ordem jurídica à coisa pública.

Ao MPF a crítica é bem-vinda, será sempre considerada, mas não resultará no abandono de suas obrigações e no cumprimento de seu papel, com lealdade e sem arrogância."

Assessoria de Comunicação
Procuradoria da República no Pará

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